INTRODUÇÃO
A perícope de Lc 10,1-12, em que Jesus fala da missão dos 72
discípulos, é de suma importância quando, hoje, a partir do Documento de
Aparecida, somos relembrados de que todo batizado é discípulo missionário de
Jesus Cristo (simbolizado pelo envio dos 72, que significa um multidão) e não
somente a Igreja hierarquia (simbolizada pelo envio dos 12 apóstolos).
Veremos que esta missão dos 72 não está a serviço da missão
dos 12, mas é uma missão totalmente nova, original, de mesma dignidade e que não tem menos
importância do que aquela.
Neste exercício de exegese, seguiremos uma metodologia que
se divide em 3 partes.
Na primeira parte, faremos as “análises preliminares”, isto
é, veremos o que o texto diz. Nesta análise preliminar, veremos qual é o texto,
como podemos trabalhá-lo separadamente, como podemos dividi-lo em uma estrutura
e, finalmente, compará-lo nas suas diferenças com seus textos paralelos.
Na segunda parte, entraremos na exegese propriamente dita,
não tendo a intenção de analisar todos os detalhes, mas sim falar do essencial
e exercitar a prática exegética.
Na terceira e última parte, olharemos a perícope em relação
com os textos imediatos e dentro do conjunto do Evangelho de Lucas.
1. ANÁLISES PRELIMINARES
Neste texto pretendemos analisar a perícope do Evangelho de
Lucas, capítulo 10, versículos 1 ao 12.
Para melhor explicitar exegeticamente o texto, antes faremos
a delimitação do texto e sua justificação. Após, proporemos uma estrutura. O
passo seguinte será identificar se há ou não textos paralelos.
1.1 Texto[1]
Depois disso, o Senhor designou
outros setenta e dois e, dois a dois, enviou-os à sua frente a toda cidade e
lugar onde ele próprio devia ir. 2 E dizia-lhes:
“A colheita é grande, mas os
operários são poucos. Pedi, pois, ao Senhor da colheita que envie operários
para a sua colheita. 3 Ide! Eis que eu vos envio como cordeiros entre
lobos. 4
Não leveis bolsa, nem alforje, nem
sandálias, e a ninguém saudeis pelo caminho. 5
Em qualquer casa em que entrardes,
dizei primeiro: ‘Paz a esta casa! 6 E se lá houver um homem de paz, a vossa paz irá
repousar sobre ele; se não, voltará a vós. 7
Permanecei nesta casa, comei e bebei
do que tiverem, pois o operário é digno do seu salário. Não passeis de casa em
casa. 8 Em qualquer cidade em que entrardes e fordes
recebido, comei o que vos servirem; 9 curai os enfermos que nela houver e dizei ao povo: ‘O
Reino de Deus está próximo de vós’. 10 Mas em qualquer cidade em que entrardes e não fordes
recebido, saí para as praças e dizei: 11‘Até a poeira da vossa cidade que se grudou aos nossos
pés, nos a sacudimos para deixá-la par vós. Sabeis, no entanto, que o Reino de
Deus está próximo.’ 12 Digo-vos que,
naquele Dia, Sodoma será mais tolerada do que aquela cidade.
1.2 Delimitação do texto
A seguir, procuraremos justificar a possibilidade de
trabalhar a nossa perícope (Lc 10,1-12) de uma forma separada. Tentaremos
provar que isto é possível lançando mão de critérios de tempo, lugar,
personagens e tema.
1.2.1 Critério de tempo
O tempo entre a perícope anterior (9,57-62) e a perícope
analisada (Lc 10,1-12) é incerto, pois o texto diz: “Depois disso, o Senhor
designou outros setenta e dois” (10,1). Este “depois disso” é incerto, pode ser
logo em seguida, pode ser um tempo depois ou dias depois.
O tempo entre a perícope analisada (Lc 10,1-12) e a
posterior (Lc 13-15) é provável que tenha sido o mesmo, já que não há uma
palavra ou frase que nos mostre uma mudança de tempo, além disso, o assunto
continua: a crítica às cidades (10,12-13ss)
1.2.2 Critério de lugar
As três perícopes (a anterior - 9,57-62 - , a que vai ser
analisada - 10,1-12 - e a posterior - 10,13-16), dentro do texto em si, compartilham
do mesmo lugar. Um lugar indeterminado à caminho de Jerusalém (9,51).
Podemos pensar que ainda estão na Samaria, onde entraram em
uma aldeia e não foram recebidos (9,52), indo então para outra aldeia (9,55)
que não sabemos se é dentro ainda da Samaria ou já é fora. Portanto, dizer que
ainda estão na Samaria é uma suposição não confirmada pelo texto.
O lugar onde acontece as três perícopes, no texto, é o mesmo
(entendendo, porém, não de forma estática, mas dinâmica, um “lugar” em movimento
de caminhada), isto é, um trecho entre a Samaria e Jerusalém.
1.2.3 Critério de personagens
Quanto aos personagens, no texto anterior à perícope
escolhida (9,57-62), temos uma mudança de personagens em relação à perícope que
vai ser estudada (10.1-12).
Na anterior, temos três personagens que dialogam com Jesus e
os ouvintes que são os discípulos. O primeiro personagem decide ir com Jesus
(9,57). Jesus adverte de que de sua vive como peregrino que não tem onde
reclinar a cabeça (9,58). O segundo, Jesus chama para que o siga. Este, porém, pede
para sepultar o seu pai (9,59). Jesus diz a ele para deixar que os mortos
sepultem os mortos e partir imediatamente, a fim de proclamar o Reino de Deus
(9,60). O terceiro se propõe a seguir Jesus, mas coloca uma condição:
despedir-se de sua família (9,61). A este Jesus repreende, dizendo que esta
condição imposta para o seguimento o faz inapto para o Reino de Deus, pois este
discípulo coloca a mão no arado e olha para traz (9,62).
A perícope analisada (10,1-12) tem novos personagens em
relação à anterior: agora não são 3 aqueles que tem a atenção especial de
Jesus, mas são 72 (Lc 10,1). Estes personagens permanecem na perícope posterior
(10,13-16), porém, não é a eles que Jesus se dirige.
Quanto a perícope posterior, os personagens, aparentemente,
permanecem os mesmos.
1.2.4 Critério de tema
A perícope de Lc 10,1-12 diverge da anterior e da posterior
no tema tratado. Se na anterior, o tema são as condições para o discipulado
individual, o tema seguinte são orientações para o apostolado coletivo dos 72
discípulos.
Vemos que a temática geral do seguimento e da missão (e da
subida para Jerusalém: 9,51) ainda continua, porém, o que antes era um chamado
particular, para aqueles que ia encontrando pelo caminho (9,57) à Jerusalém
(9,51), agora Jesus chama um grupo: 72 discípulos (10,1). A este grupo ele vai
instruir (10,4-9), encorajar de possíveis dificuldades (10,10-12) e enviar (10,1-3).
A perícope seguinte, quanto à temática, vai “continuar”
encorajando os discípulos acerca das dificuldades que poderão encontrar, como
não ser bem recebidos: “Mas em qualquer cidade em que entrardes e não fordes
recebido, saí para as praças e dizei: ‘Até a poeira da vossa cidade que se
grudou aos nossos pés, nos a sacudimos para deixá-la par vós. Sabeis, no
entanto, que o Reino de Deus está próximo.’
Digo-vos que, naquele Dia, Sodoma será mais tolerada do que aquela
cidade” (10,10-12). Todavia, este terá uma novidade, pois Jesus agora não fala
mais aos discípulos como em 10,12 (digo-vos: lego hymin[2]),
dirige-se agora às cidades de Corazim e Betsaida: “Ai de ti, Corazim! Ai de ti,
Betsaida!” (10,13: Ouaí soi, Khoradzín,
ouaí soi, Bethsaidá[3]).
Não obstante, nesta perícope posterior, este “continuar” encorajando da parte
de Jesus não se refere diretamente a uma crítica àquelas cidades que
posteriormente não receberão bem os discípulos (no futuro), mas aquelas que não
receberam o próprio Jesus (no presente), daí a condenação de Corazim e
Betsaida, que não o acolheram, não obstante os sinais de Jesus: “Porque se em
Tiro e Sidônia tivessem sido realizados os milagres que em vós se realizaram” (10,13:
Hóti ei en Tyro kaì Sidôni egenéthesan ai
dynámeis hai genómenai em hymin[4]).
Jesus, então, vai dizer que, se no futuro, os discípulos também não forem bem
acolhidos, é o próprio Cristo que não será acolhido, e se forem bem acolhidos,
é o Cristo que será bem acolhido: “Quem vos ouve a mim ouve, quem vos despreza
a mim despreza, e que me despreza, despreza aquele que me enviou.” (Lc 10,16).
1.2.5 Conclusão: porque analisaremos esta perícope separada da anterior e da posterior
Afirmamos que há uma corte entre a perícope que pretendemos
analisar e a perícope posterior em dois sentidos: na mudança de interlocutor
(antes eram o grupo dos 72, agora são as cidades de Corazim e Betsaida). Temos
um corte, também, com a perícope anterior no critério de personagens. Continua
Jesus e os discípulos, porém, os interlocutores diretos de Jesus não serão mais
3, serão 72.
Além disso, há um corte de tema com a perícope anterior e a
posterior. Se na anterior o tema era as condições do discipulado individual,
agora são orientações para o discipulado coletivo. Se na perícope analisada o
tema é a crítica às cidades que posteriormente não receberão os discípulos (no
futuro), na perícope posterior a crítica é às cidades que não receberam o
próprio Jesus (no passado).
1.3 Estrutura do texto[5]
Dividiremos o texto em 3 partes:
1) Escolha, motivação e mandato de envio em território
perigoso (1-3);
2) Orientações diversas para a missão (4-9) e
3) Orientações sobre possíveis dificuldades e encorajamento
(10-12)
I.
Escolha,
motivação e mandato de envio em território perigoso (1-3)
v. 1 Escolha.
v. 2 Constatação da falta de operários e o que se deve fazer.
v. 3 Mandato de envio aviso que encontrarão perigo.
Nesta primeira parte destacamos que Jesus escolhe os 72
discípulos e diz que vai os enviar em missão. Explica a eles qual é a
importância desta missão (que há poucos operários) e que é necessário pedir ao
Pai que envie mais operários para a missão. Logo em seguida, Jesus novamente
diz que vai enviá-los, mas como “cordeiros em meio a lobos”, para deixar claro
que os discípulos encontrarão dificuldades e perigos.
II.
Orientações
diversas para a missão (4-9)
v. 4 Orientações para o que levar e como se comportar no
caminho da missão.
vv. 5-6 O que fazer quando chegar em um casa.
v. 7-9 Orientações para quando permanecer em uma casa ou em
uma cidade.
Nesta segunda parte Jesus dá orientações aos discípulos:
como se comportar no caminho, o que levar, o que fazer ao chegar em uma casa e
como se comportar em uma casa ou cidade.
III.
Orientações
sobre possíveis dificuldades e encorajamento (10-12)
vv. 10-11 O que fazer quando não for bem recebido em uma
cidade.
v. 12 O que acontecerá à cidade que não tiver acolhido bem.
Esta terceira parte nos mostra que Jesus, assim com já tinha
previsto no início da perícope, que o campo de missão seria perigoso (10,3),
que estariam como “ovelhas entre lobos”, fala sobre o que fazer quando os
discípulos forem rejeitados em determinadas cidades, e o que acontecerá a esta
cidade como forma de encorajamento: que eles estarão sob a proteção do
julgamento divino.
1.3 Texto paralelo
O fato é que somente Lucas relata o envio dos setenta e dois
discípulos[6].
Assim, Leon Morris, na sua tabela de
sinóticos, diz que não há paralelos para esta perícope:
TABELA DE SINÓTICAS DE MORRIS[7]
LUCAS
|
MARCOS
|
MATEUS
|
|
A missão dos setenta
|
10,1-12
|
||
A perdição das cidades da Galiléia
|
10,13-16
|
11,21-24
|
|
O regresso dos setenta
|
10,17-20
|
||
A exultação de Jesus
|
10,21-24
|
11,25-27
|
Porém, este texto de Lucas, em grande parte é semelhante ao
material de Mateus no relato do envio dos Doze. O exegeta Champlin afirma que
esta semelhança significa que Mateus e Lucas utilizaram-se da mesma fonte
(fonte Q)[8],
e acrescentaram seu material particular.
TEXTOS ATRIBUÍDOS À FONTE Q
Lucas
|
Mateus
|
Tema
|
Envio dos discípulos - missão
|
||
9,57-60
|
8,19-22
|
Exigências do seguimento de Jesus
|
10,1-12
|
9,37-38.10,9-16a
|
Discurso da missão
|
10,13-15
|
11,21-23
|
Ai das cidades impenitentes
|
10,16
|
10,40
|
A autoridade dos enviados
|
Champlin, a partir daí, afirma que, se não há um paralelo
direto, há um paralelo indireto para esta perícope. Se em Lucas temos o texto
em um único bloco, em Mateus se divide em 6 blocos, pois correspondia a
intenção de cada um deles optar por um esquema de construção do texto[11].
No quadro montado por
Champlin, temos os paralelos de Lucas e Mateus expostos em versículos.
TABELA DE PARALELOS SINÓTICOS DE CHAMPLIN[12]
LUCAS 10
|
MATEUS
|
v 1 (Lucas somente)
Depois disso, o Senhor designou outros setenta e dois e,
dois a dois, enviou-os à sua frente a toda cidade e lugar onde ele próprio
devia ir.
|
|
v 2
E dizia-lhes: “A colheita é grande, mas os operários são
poucos. Pedi, pois, ao Senhor da colheita que envie operários para a sua colheita.
|
9,37-38
“A colheita é grande, mas poucos os operários! Pedi, pois,
ao Senhor da colheita que envie operários para a sua colheita.
|
v 3
Ide! Eis que eu vos envio como cordeiros entre lobos.
|
10,16
Eis que eu vos envio como ovelhas entre lobos. Por isso,
sede prudentes como as serpentes e sem malícia como as pombas.
|
v 4
Não leveis bolsa, nem
alforje, nem sandálias, e a ninguém saudeis pelo caminho.
|
10,9-10 com leves variações
Não leveis ouro, nem prata, nem cobre nos vossos cintos, nem
alforje para o caminho, nem duas túnicas, nem sandálias, nem cajado: pois o
operário é digno de seu sustento.
|
vv 5-6
Em qualquer casa em que entrardes, dizei primeiro: ‘Paz a
esta casa! E se lá houver um
homem de paz, a vossa paz irá repousar sobre ele; se não, voltará a vós.
|
10,11-13 com leves
variações
Quando entrardes numa cidade ou numa aldeia, procurai saber
de alguém que seja digno e permanecei ali até vos retirardes do lugar. Ao
entrardes na casa, saudai-a. E, se for digna, desça a vossa paz sobre ela. Se
não for digna, volte a vós a vossa paz.
|
v 7
Permanecei nesta casa, comei e bebei do que tiverem, pois o
operário é digno do seu salário. Não passeis de casa em casa.
|
10,11 com leves
variações
Quando entrardes numa cidade ou numa aldeia, procurai saber
de alguém que seja digno e permanecei ali até vos retirardes do lugar.
|
vv 8-9 (Lucas somente)
Em qualquer cidade em que entrardes e fordes recebido, comei
o que vos servirem; curai os enfermos que nela houver e dizei ao povo: ‘O
Reino de Deus está próximo de vós’.
|
|
vv 10-11
Mas em qualquer cidade em que entrardes e não fordes
recebido, saí para as praças e dizei: ‘Até a poeira da vossa cidade que se
grudou aos nossos pés, nos a sacudimos para deixá-la par vós. Sabeis, no
entanto, que o Reino de Deus está próximo.’
|
10,14
Mas, se alguém não vos recebe e não dá ouvidos às vossas
palavras, saí daquela casa ou daquela cidade e sacudi o pó dos vossos pés.
|
v 12
Digo-vos que, naquele Dia, Sodoma será mais tolerada do que
aquela cidade.
|
10,15
Em verdade vos digo que o Dia do Juízo será mais tolerável
para Sodoma e Gomorra do que para aquela cidade.
|
Optando por aceitar a tese de que há um paralelo em Lc e Mt,
analisaremos em que pontos estes paralelos divergem. Lembramos, porém, que Lc
fala do envio dos setenta e dois, e Mt, do envio dos Doze.
No v. 1 de Lc não há paralelo com Mt.
No v. 2 de Lc, parece-nos que os textos são idênticos a Mt 9,37-38.
No v. 3 de Lc não há o acréscimo que há em Mt 10,16, de que
os discípulos devem ser prudentes como as serpentes e sem malícia como as
pombas.
No v. 4 de Lc há o acréscimo de não saudar ninguém no
caminho, enquanto que em Mt 10,9-10 o discípulo, além de não levar bolsa, nem alforje,
nem sandálias, também não deve levar ouro, nem prata, nem cobre, nem duas
túnicas, nem cajado, pois o operário é digno de seu sustento.
Nos vv 5-6 de Lc, quando o discípulo entrar em uma casa, ele
primeiro deve desejar a paz ou abençoar com a paz aquela casa. Se o anfitrião
não for digno, a paz retornará. Em Mt 10,11-13, o discípulo, quando entrar numa
aldeia (e não ainda numa casa) deve primeiro saber se há alguém digno da
visita. Após, há a visita com a saudação (não fala que é com a paz). Se o
anfitrião não for digno, a saudação retornará.
No v. 7 há um problema com o paralelo de Champlin, que cita
Mt 10,11, porém, é mais evidente que o paralelo seja Mt 10,10, pois os dois
falarão que o trabalhador é digno de seu salário.
Nos vv 8-9 de Lc novamente não temos paralelo em Mt.
Nos vv 10-11 de Lc temos o acréscimo de que o discípulo deve
dizer que o Reino de Deus está próximo, o que não se encontra em Mt 10,14.
No v. 12, Lc cita somente o castigo de Sodoma, enquanto Mt
10,15 cita junto ao castigo de Sodoma, o de Gomorra.
1.4 Considerações conclusivas
Chegamos então ao fim da introdução necessária para a
análise exegética, constatando que é possível trabalhar a perícope de Lc
10,1-12 em separado do restante do livro, e que pode ser divido esta perícope
em 3 partes: 1) Escolha, motivação e mandato de envio em território perigoso
(1-3); 2) Orientações diversas para a missão
(4-9) e 3) Orientações sobre possíveis dificuldades e encorajamento
(10-12).
Também vimos que há uma discussão se há ou não um paralelo
para este texto. Aceitamos a tese de que há um paralelo.
2. EXEGESE DO TEXTO
Se há um paralelo com Mateus, no envio dos Doze, de modo
algum podemos concluir imediatamente que o envio dos setenta e dois seja
variação ou extensão de continuidade do envio dos Doze. São duas missões
distintas. Isso quer significar que não somente os doze tiveram o mandato do
apostolado em nome de Cristo[13].
Poderíamos perguntar: por que Mateus não registra a missão
dos setenta e dois? Uma resposta seria: porque esta missão não existiu. Outra
resposta, mais satisfatória, diz que a missão dos setenta e dois se constitui
no último período da missão de Jesus, e que seu material é escasso. Assim, a
missão de Jesus se dividiria em 3 etapas: a primeira, com quatro pescadores, a
segunda com Doze apóstolos e a terceira com setenta e dois discípulos.[14]
Analisaremos, a seguir, as três partes constituídas pela
perícope, de acordo com a proposta de estrutura do texto anteriormente
explicitada.
I. Escolha, motivação
e mandato de envio em território perigoso (1-3)
v. 1 Escolha
“Depois disso, o Senhor
designou outros setenta e dois e, dois a dois, enviou-os à sua frente a toda
cidade e lugar onde ele próprio devia ir.”
Com a expressão “outros setenta e dois discípulos”, Jesus
não quis dizer que já havia enviado em algum outro momento setenta e dois
discípulos. Quer dizer que envia mais discípulos, além dos doze que enviara.
Champlin acredita que esse ministério aos setenta e dois pode
ter acontecido na Judéia[15]
e o envio dos 12, na Galiléia. Porém, como dissemos anteriormente na análise
preliminar do texto, não podemos afirmar com certeza onde foi, mas desde onde
até onde se encontra este chamado e envio: da Samaria à Jerusalém, na Judéia.
Outra questão é o número de discípulos que Jesus enviou: 70
ou 72? Essa questão não está perto de uma definição consensual. Muitas boas
traduções registram 70 discípulos, outra boas traduções já registram 72, que é
o mais provável. Uma interpretação é que o número significa uma grande
quantidade de discípulos.[16]
O livro do Gênesis, capítulo 10, registra, na tradução
hebraica, o número de 70 nomes que faziam parte da descendência de Noé, já a
tradução grega (dos LXX) registra o número de 72, para significar todos os
povos do mundo.[17]
Outra associação é com os 70 anciãos que Moisés nomeou e os
dois que ficaram no acampamento (Nm 11,16-17), e Jesus seria um novo Moisés.
Também o número 70 é associado aos 70 membros do Sinédrio que esperavam a vida
do Messias.[18]
v. 2 Constatação da falta de operários e o que se deve fazer
“E dizia-lhes: ‘A
colheita é grande, mas os operários são poucos. Pedi, pois, ao Senhor da
colheita que envie operários para a sua colheita’.”
As palavras que Jesus utiliza neste versículo já havia
utilizado outras vezes (Mt 9,37-38; Jo 4,35).[19]
Champlin fala que esta declaração era uma das favoritas de Jesus (havendo
paralelos em João 4,35 e Mateus 9,37-38).[20]
Jesus utiliza-se da imagem de uma plantação em tempo de
colheita. Para que haja colheita, é necessário muitos trabalhadores.
Esta plantação tem como dono o próprio Deus. É ele quem toma
iniciativa de chamar os trabalhadores. Diante da gratuidade de Deus, o envio de
mais trabalhadores se dá através da oração a Deus.[21]
v. 3 Mandato de envio e que encontrarão perigo.
“Ide! Eis que eu vos
envio como cordeiros entre lobos.”
Esta frase é tomada da tradição judaica (Israel são os
cordeiros e os pagãos são os lobos), é também usada para as primeiras
comunidades (cf. At 20,29: Jo 10,12).
Significa que eles tem apenas a ferramenta da persuasão da
palavra e do exemplo. De modo algum podem utilizar-se da violência. Junto a
essa fragilidade, está também a pobreza como condição de possibilidade para a
liberdade do discípulo missionário.[22]
O discípulo missionário fica a mercê das circunstâncias, sem nenhuma garantia
de sustento e de ser aceito.[23]
Outra conclusão é que Jesus, além de prever que há perigos,
também tem o domínio sobre estes perigos, ou seja, tudo o que acontecesse aos
discípulos já estaria dentro de um propósito, não acontecendo nada por acaso.[24]
Deus estaria preservando o bem estar e a integridade do discípulo em meio a uma
geração pervertida.
II. Orientações
diversas para a missão (4-9)
v. 4 Orientações para o que levar e como se comportar no caminho da
missão.
“Não leveis bolsa, nem
alforje, nem sandálias, e a ninguém saudeis pelo caminho.”
A expressão ballantio
(bolsa) é usado somente por Lucas. A bolsa era algo onde se carregava o
dinheiro.
O fato de não levar sandálias significava que não era para
levar um par a mais, além do que o discípulo estava utilizando.
O pedido para não saudar ninguém era porque as saudações no
oriente são muito demoradas, pois compõem-se de muitos detalhes que devem ser
respeitados[25].
A missão exigia pressa.[26]
No Talmude havia um texto[27]
que dizia que não se devia levar cajado, sapato, sacola ou dinheiro quanto se ia
para o Templo rezar. Daí que a missão dos discípulos era tão importante, que
suas atitudes deveriam ser semelhantes a de quem vai rezar no Templo.
vv. 5-6 O que fazer quando chegar em um casa
v. 5 “Em qualquer casa
em que entrardes, dizei primeiro: ‘Paz a esta casa!
v. 6 E se lá houver um
homem de paz, a vossa paz irá repousar sobre ele; se não, voltará a vós.”
Parece significar que a primeira atitude dos discípulos missionários,
antes de entrar em uma casa, é dar a saudação da paz que era um tipo de bênção
semita. Mas, se o dono da casa não desejasse receber, esta bênção retornaria a
quem abençoou, pois ninguém seria forçado a receber aquilo que não quer: “os
discípulos não estariam procurando
transmitir uma bênção para alguém que não deseja recebê-la.” (Morris, 1990, p.
172)
v. 7-9 Orientações para quando permanecer em uma casa ou em uma cidade.
v. 7 “Permanecei nesta
casa, comei e bebei do que tiverem, pois o operário é digno do seu salário. Não
passeis de casa em casa.”
v. 8 Em qualquer cidade
em que entrardes e fordes recebido, comei o que vos servirem;
v. 9 Curai os enfermos
que nela houver e dizei ao povo: ‘O Reino de Deus está próximo de vós’.”
Na missão, o discípulo missionário deve submeter-se às
diversas circunstâncias que se oferecerem, para que nada impeça a missão. Para
isso, os tabus alimentares e de pureza dos judeus não deveriam ser impedimento
para a missão, pois o missionário está levando um último e urgente apelo de
salvação a todos que aceitarem.[28]
Este anúncio é levado dois a dois. Todos são convidados a
faze parte do Reino.[29]
O mandato de curar os enfermos, anunciar que o Reino está
próximo, é algo que Jesus já estava fazendo e que havia sido ordenado aos 12
que também fizessem.[30]
Podemos ver que não se trata de uma extensão deste mandato, mas um mandato
totalmente singular, novo.
III. Orientações
sobre possíveis dificuldades e encorajamento (10-12)
vv. 10-11 O que fazer quando não for bem recebido em uma cidade.
v. 10 “Mas em qualquer
cidade em que entrardes e não fordes recebido, saí para as praças e dizei:
v. 11 ‘Até a poeira da
vossa cidade que se grudou aos nossos pés, nos a sacudimos para deixá-la par
vós. Sabeis, no entanto, que o Reino de Deus está próximo.’.”
Se acaso não fossem recebidos com a mensagem do Reino de
Deus, os discípulos teriam duas outras mensagens. A primeira é que este povo se
auto-exclui do povo de Deus, e a segunda é que esta recusa não modifica a
realidade do Reino, que está próxima. A recusa, portanto, não é recusa aos pregadores,
mas ao Reino de Deus. A consequência era que as pessoas estavam atraindo para
si o julgamento.[31] “Desse modo, a mensagem de misericórdia se
transmuta em sentença condenatória, quando é ignorada ou repelida.” (Champlin,
1980, p. 104)
v. 12 O que acontecerá à cidade que não tiver acolhido bem.
“Digo-vos que, naquele
Dia, Sodoma será mais tolerada do que aquela cidade.”
No dia do julgamento, as cidades que se recusaram a aderir
ao Reino de Deus, serão julgadas com mais rigor do que a cidade de Sodoma, do
Antigo Testamento (Gn 19,13.24-25).[32]
3. O TEXTO NO CONTEXTO
Neste capítulo, veremos que a perícope escolhida faz parte
de um conjunto maior dentro do Evangelho de Lucas.
3.1. Relação com o conteúdo imediato
No fragmento anterior, Jesus decide partir para Jerusalém
(9,51). A partir daí, temos uma temática comum: a eleição, a instrução e o
envio dos discípulos.
Na perícope anterior, Jesus encontra três pessoas no caminho
onde acontece um diálogo vocacional, ou seja, apresenta-se a oportunidade de
seguir Jesus (9,57-62). Na perícope que analisamos (10,1-12), temos a instrução
e o envio dos 72 discípulos. Na perícope posterior temos a crítica a Corazim e
Betsaida (10,13) que recusaram a aceitá-lo anteriormente na sua missão. A
temática da missão termina quando um doutor da Lei interroga Jesus acerca do
que é necessário fazer para ganhar a vida eterna (10,25ss). Portanto, a
perícope faz parte de um bloco único cuja temática é a missão, e de um bloco
maior, que veremos a seguir, que é o caminho para Jerusalém.
3.2 A função da perícope no livro
Esta perícope analisada está dentro de um fragmento do livro
de Lucas que podemos intitular “da Galiléia para Jerusalém[33]”
(9,51-19-44) quando, em 9,51 Jesus decide partir para Jerusalém. Ir para
Jerusalém significa, também, ir em direção à cruz e à ressurreição.
Morris divide o livro de Lucas em oito partes:
1) as narrativas da infância (1,5-2,52);
2) o começo do ministério de Jesus (3,21-4,13);
3) o ministério de João Batista (3,1-20);
4) Jesus na Galiléia (4,14-9,50);
5) da Galiléia para Jerusalém (9,51-19,44);
6) Jesus em Jerusalém (19,45-21,38);
7) a crucificação (22,1-23,56) e
8) a ressurreição (24,1-53).
Apresentamos, no final do texto, uma divisão do livro de
Lucas proposta por Morris.
Fabris e Maggioni dividem essa caminhada nos seguintes
passos[34]:
a)
Jesus é seguido pelos discípulos e por uma
grande multidão (9,51-62);
b)
Aos discípulos ele dá instruções para segui-lo
(12,1-48);
c)
À multidão, ele convida para a conversão
(12,49-13,21);
d)
Jesus faz uma pausa para contar duas parábolas,
que explicitam a característica de sua ação. (14 – 15)
e)
Antes de chegar às portas de Jerusalém, retomas
os temas mais importantes: sobre uso dos bens (16), sobre responsabilidade e
perseverança na espera do Filho do Homem e a importância de não cair em
fanatismo e impaciência (17,22-37; 18,1-8; 19,11-27); sopre a salvação e o
perdão dos pecados oferecidos aos excluídos e pecadores (17,11-19; 18,9-4;
19,1-10).
CONCLUSÃO
Neste exercício exegético, procuramos tirar o máximo
proveito dos autores que nos auxiliaram neste percurso, e nos indicaram que, em
uma visão sincrônica dos Evangelhos, a perícope quer demonstrar que a missão
dos setenta e dois discípulos não está subalterna à missão dos Doze, mas é uma
missão de mesma importância, com praticamente o mesmo mandato, salvo algumas
diferenças.
Findo o nosso exercício exegético, temos uma convicção de
que posteriormente poderemos continuar aprofundando este tema e esta perícope,
pois o texto ainda tem muito a nos ensinar.
APÊNDICE
PREFÁCIO (1,1-4) [35]
1. AS NARRATIVAS DA INFÂNCIA
(1,5-2,52)
a. Predito o nascimento de João
Batista (1,5-25)
b. Predito o nascimento de Jesus
(1,26-38)
c. Maria visita Isabel (1,39-45)
d. o cântico de Maria (1,46-56)
e. O nascimento de João Batista
e sua nomeação (1,57-66)
f. O Cântico de Zacarias
(1,67-80)
g. O nascimento de Jesus (2,1-7)
h. Os anjos e os pastores
(2,8-20)
j. o menino Jesus (2,21-40)
l. O menino Jesus no Templo
(2,41-52)
II. O COMEÇO DO MINISTÉRIO DE
JESUS (3,21-4,13)
a. O batismo de Jesus (3,21-22)
b. A genealogia de Jesus
(3,23-38)
c. As tentações de Jesus
(4,1-13)
III. O MINISTÉRIO DE JOÃO
BATISTA (3,1-20)
IV. JESUS NA GALILÉIA
(4,14-9,50)
a. O sermão em Nazaré (4,14-30)
b. Jesus curando (4,31-41)
c. Um circuito de pregação
(4,42-44)
d. Os milagres de Jesus (5,1-26)
e. A chamada de Levi (5,27-32)
f. Jejum (5,33-39)
g. o emprego certo do sábado
(6,1-11)
h. A escolha dos Doze (6,12-16)
i. O sermão da planície
(6,17-49)
j. A cura do servo de um
centurião (7,1-10)
k. O filho da viúva de Naim (7,11-17)
l. As perguntas de João Batista
(7,18-35)
m. A pecadora que ungiu os pés
de Jesus (7,36-50)
n. As mulheres que serviram a
Jesus (8,1-3)
o. A parábola do semeador
(8,4-15)
p. A candeia e seu esconderijo
(8,16-18)
q. A mãe e os irmãos de Jesus
(8,19-21)
r. Jesus acalma a tempestade
(8,22-25)
s. O endemoninhado geraseno
(8,26-39)
t. A filha de Jairo (8,40-56)
u. A missão dos Doze (9,1-6)
v. Herodes o Tetrarca (9,7-9)
w. A multiplicação dos pães para
os cinco mil (9,10-17)
x. O discipulado (9,18-27)
y. A transfiguração (9,28-36)
z. Jesus e os discípulos
(9,37-50)
V. DA GALILÉIA PARA JERUSALÉM
(9,51-19,44)
a. Mais lição acerca do
discipulado (9,51-62)
b. A missão dos setenta
(10,1-24)
c. A parábola do bom samaritano
(10,25-37)
d. Marta e Maria (10,38-42)
e. Oração (11,1-13)
f. Jesus e os demônios
(11,14-26)
g. Jesus ensina o povo
(11,27-12,59)
h. O arrependimento (13,1-9)
i. A cura da mulher encurvada
(13,10-17)
j. O reino de Deus (13,18-30)
k. Os profetas perecem em
Jerusalém (13,31-35)
l. O jantar com um fariseu
(14,1-24)
m. O discipulado (14,25-35)
n. Três parábolas dos perdidos
(15,1-32)
o. Ensinos, principalmente
acerca do dinheiro (16,1-31)
p. Ensinos acerca do serviço
(17,1-10)
q. Os dez leprosos (17,11-19)
r. A vinda do reino de Deus
(17,20-37)
s. Duas parábolas acerca da
oração (18,1-14)
t. Jesus e as crianças
(18,15-17)
u. O jovem rico (18,18-30)
v. Outra profecia da Paixão
(18,35-43)
w. A cura do cego (18,35-43)
x. Zaqueu (19,1-10)
y. A parábola das dez minas
(19,11-27)
z. A entrada triunfal (19,38-44)
VI. JESUS EM JERUSALÉM
(19,45-21,38)
a. A purificação do Templo
(19,45,46)
b. Ensinando no Templo
(19,45,46)
c. autoridade de Jesus (20,1-8)
d. A parábola dos lavradores
maus (20,9-18)
e. Tentativas para apanhar Jesus
numa palavra (20,19-44)
f. Advertências contra os
escribas (20,45-47)
g. A oferta da viúva pobre
(21,1-4)
h. Discurso escatológico
(21,5-36)
i. Ensinando no Templo
(21,37-38)
VII. A CRUCIFICAÇÃO (22,1-23,56)
a. A traição (22,1-6)
b. No cenáculo (22,7-38)
c. A agonia no Getsêmani (22,39-46)
d. Jesus é preso (22,47-54)
e. Pedro nega a Jesus
(22,54b-62)
f. Os guardas zombam de Jesus
(22,63-65)
g. Jesus perante o Sinédrio
(22,66-71)
h. Jesus perante Pilatos
(23,1-5)
i. Jesus é sentenciado
(23,13-25)
j. Jesus é crucificado
(23,26-49)
l. O sepultamento de Jesus
(23,50-56)
VIII. A RESSURREIÇÃO (24,1-53)
a. O aparecimento às mulheres
(24,1-11)
b. Pedro no sepulcro (24,12)
c. A caminhada a Emaús
(24,13-35)
d. Jesus aparece aos discípulos
(24,36-43)
e. O cumprimento das Escrituras (24,44-49)
f. A ascensão (24,50-53)
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BÍBLIA DE JERUSALÉM. São Paulo: Paulinas, 1973.
CHAMPLIN, Russel Normann. O
novo testamento interpretado: versículo por versículo. São Paulo: Milenium
Distribuidora Cultura, 1980.
FABRIS, Rinaldo e MAGGIONI, Bruno. Os Evangelhos II. Tradução de Giovani di Biasio e Johan Konings.
São Paulo: Loyola, 1992.
MORRIS, Leon L. Lucas:
introdução e comentário. Tradução de
Gordon Chown. São Paulo: Sociedade religiosa edições vida nova e associação
religiosa editora mundo cristão, 1990.
NOVO TESTAMENTO INTERLINEAR GREGO-PORTUGUÊS. Barueri: Sociedade
Bíblica do Brasil, 2009.
WEGNER, Uwe. Exegese do
Novo Testamento: manual de metodologia. 2 ed. Paulus/Sinodal, 2001.
[1] Bíblia de Jerusalém, São
Paulo: Paulinas, 1973
[2] Novo Testamento
interlinear Grego-Português.
[3] Novo Testamento
interlinear Grego-Português.
[4] Novo Testamento
interlinear Grego-Português.
[5] Esquema próprio.
[6] Morris, 1990, p. 171;
Fabris e Maggioni, 1992, p. 121
[7] Morris, 1990, p. 327
[8] Champlin, 1980, p. 101
[9] Wegner, 2001, p. 109
[10] “Chegamos, em tese, ao
texto original da fonte Q quando, numa comparação entre os texto de Mt e Lc,
suprimimos deles todas as características reconhecidamente redacionais do
primeiro e terceiro evangelistas. Por aproximações, um texto terá tanto mais
condições de representar o original da fonte Q quanto menos estiver revestido
de vocabulários, gramática e estilo preteridos por Mt ou Lc. Dizemos ‘por
aproximação’, pois nada impede que, em certos casos, o estilo original da fonte
Q coincida com o estilo preferencial de um destes evangelistas.” (Wegner, 2001,
p. 160)
[11] Por conseguinte, parece que o material que é reunido em um único
bloco, no Evangelho de Lucas, é disperso em seis
diferentes capítulos no Evangelho de Mateus. Tudo isso mostra o desígnio de
cada autor sagrado no arranjo de seu material, porquanto cada um deles tinha um
propósito diverso ao apresentar as informações onde e como desejam fazê-lo.
(Champlin, 1980, p. 102)
[12] Champlin, 1980, p. 102.
[13] “Algumas das instruções
são semelhantes àquelas no relato em Mateus no envio dos Doze. Isto leva alguns
estudiosos a adotarem o ponto de vista de que esta passagem nada mais é do que
uma variação das instruções que foram dada aos Doze em Mateus. Tal idéia, na
frase de Plummer, ‘não sustenta a crítica.’ O fato de Lucas ter registrado esta
missão em proximidade tão estreita com a dos Doze (que registra em 9,1-16),
demonstra que ela as considerava distintas entre si. Cada uma é inteligível no
seu próprio lugar. E, conforme indica Manson, é provável que Jesus utilizasse
os serviços doutras pessoas fora dos Doze, e igualmente provável que este fato
fosse enriquecido em grande medida tendo em vista o lugar dado aos Doze nas
reminiscências cristãs.” (Morris, 1990, p. 171)
[14] Champlin, 1980, p. 101
[15] Champlin, 1980, p. 102
[16] “Número 72 (ou 70,
segundo alguns manuscritos). Provavelmente com este número se quer indicar um
grupo amplo de discípulos que foram associados à atividade de Jesus.” (Fabris e
Maggioni, 1992, p. 121)
[17] Fabris e Maggioni, 1992,
p. 121
[18] “O número parece ser um
símbolo das nações do mundo, conceito este que os judeus baseavam em Gênesis
10, onde há setenta nomes nos textos hebraicos e setenta e dois na LXX. Outros,
porém, associam o número com aqueles anciãos nomeados por Moisés (Nm 11:16-17:
setenta e dois com os sois que permaneceram no arraial). (Vêem Jesus como sendo
o segundo Moisés. Ainda outros pensam nos setenta membros do Sinédrio, os
líderes religiosos que deveriam estar preparados para a vinda do Messias.”
(Morris, 1990, p. 171)
[19] Morris, 1990, p. 172
[20] “ESSA DECLARAÇÃO
evidentemente era uma das favoritas de Jesus, pelo fato de que a temos em Lucas
nesta referência, havendo paralelos similares diretos em João 4,35 e Mt
9,37,38. A declaração, pois, é posta em diferentes contextos históricos.”
(Champlin, 1980, p. 103)
[21] Fabris e Maggioni, 1992,
p. 121
[22] Fabris e Maggioni, 1992,
p. 121
[23] “O missionário fica
completamente exposto, também no que diz respeito à sua sustentação, aos riscos
da missão: acolhimento ou rejeição, sucessão ou fracasso. Não há garantias
secretas.” (Fabris e Maggioni, 1992, p. 121-122)
[24] Champlin, 1980, p. 103
[25] “A bolsa (ballantion) é para
dinheiro. A palavra é usada somente por Lucas no Novo Testamento. O alforje (pera) é um saco de viagem. Que não devem levar sandálias provavelmente significa, não que devem andar descalços, mas,
sim, que não deve carregar um par extra. Devem ir conforme estão. A ninguém saudeis pelo caminho não é uma
exortação à descortesia: é uma lembrança que seu negócio é urgente e que não
devem atrasá-lo por meio de demorar-se com conhecidos ao longo do caminho. As
saudações orientais podem ser muito detalhadas e consumir muito tempo.”
(Morris, 1990, p. 172)
[26] Champlin, 1980, p. 103
[27] Champlin, 1980, p. 103
[28] “Nada pode deter ou
impedir o prosseguimento de seu mandato: não a busca de uma hospedagem mais cômoda,
nem os tabus alimentares, que impediam os judeus de freqüentar ambientes
pagãos; nem a rejeição ou oposição de pessoas. Ele é um enviado que traz o
último e urgente apelo e a possibilidade de salvação, que devem chegar aos
ouvidos de todos, custo o que custar.” (Fabris e Maggioni, 1992, p. 122)
[29] Fabris e Maggioni, 1992,
p. 121
[30] Champlin, 1980, p. 104
[31] “Talvez uma cidade não os
receberia. Então, devem sair pela ruas com sua mensagem. Devem contar ao povo duas.
Em primeiro lugar, devem sacudir contra ele o pó dos seus pés. Informa os
cidadãos de modo simbólico que se colocaram fora do povo de Deus. Em segundo
lugar, que a atitude deles não altera as realidades. A sua rejeição dele não
altera o fato de que era nada menos do que o reino de Deus que tinha estado próximo.
Ao rejeitarem os pregadores não estavam rejeitando um par de pobres
itinerantes, mas, sim, o próprio reino de Deus, e isso tem sérias
conseqüências. As pessoas atraíam o julgamento para si mesma. (Morris, 1990, p.
173)
[32] “Naquele dia não é explicitado, mas claramente significa o dia
terrível do julgamento (cf. 12,34; Mt 7,22; 2Ts 1,10; 2Tm 1,12.18; 4,8). Então
haveria menos rigor para Sodoma do
que para aqueles transgressores. A destruição de Sodoma (Gn 19,13. 24-25) fez
com que aquela cidade ficasse proverbial para o julgamento divino dos
perversos. A culpa daqueles que rejeitassem os mensageiros do Reino de Deus é
enfatizado pela alusão.” (Morris, 1990, p. 173)
[33] Morris, 1990, p. 61. Já
Fabris e Maggioni intitulam “a caminho de Jerusalém”, e dividem em Lc
9,51-19,28 (Fabris e Maggioni, 1992, p. 116)
[34] Fabris e Maggioni, 1992,
p. 13
[35] Morris, 1990, p. 60-62.
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